terça-feira, 14 de setembro de 2010

Histórias Antigas



"Ainda não me esgotei, ainda aqui estou, ainda não saí de ti, estou aqui, agora, com uma persistência velhaca, a contar-te histórias muito antigas como aquela que já não te recordas. A história da menina que pensava não saber amar, pois lhe tinham dito, na sua tenra idade, que o amor é coisa de graúdos, de idade adulta, a que nunca chegaria com o seu olhar infantil. O mesmo olhar que tratou com cuidado as pequenas coisas a que se foi dedicando na esperança de que um destes dias o amor lhe aparecesse sem avisar. E o amor não vinha nem dava sinais, não porque não pudesse aparecer mas porque já lá estava. Porque o amor não aparece, germina. E então um dia percebeu que o amor era aquilo, uma coisa muito simples, nada complicada, uma desilusão até em nada semelhante ao que ouvia dizer por aí. E então percebeu que sempre tinha amado, embora não soubesse. E que sempre tinha sido muito feliz sem gozar da plenitude dessa felicidade, porque pensava que havia uma outra, como versão melhorada da mesma coisa. O amor, de facto, nunca veio porque já tinha nascido, com ela, sem que disso se desse conta.
O amor não é palpável nem voa nos céus em formatos cilíndricos mas vê-se nos quadros, no cinema, no abraço quente tão apertado como os outros e sem espaço para nenhum outro."

in "No dia que fugimos tu não estavas em casa", página 20, Fernando Alvim

1 comentário:

  1. Já me tinha esquecido que queria ler esse livro. Obrigada pela lembrança e quick preview.

    ResponderEliminar